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quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Nota da Andacon sobre cotas raciais em concursos públicos

Conforme amplamente noticiado pela mídia, a Presidente Dilma encaminhou ao Congresso Nacional projeto de lei que cria reserva de 20% das vagas em concursos públicos para negros. Até o momento, o texto do projeto não foi publicado nos sites da Presidência da República ou da Câmara dos Deputados. Em suma, a Associação Nacional dos Concurseiros – Andacon posiciona-se contra o projeto pelas razões a seguir.

Cotas raciais em concursos públicos ferem a Constituição da República. A reserva de vagas para pessoas com deficiência foi estabelecida pela Constituição, segundo a qual, a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão (CF, art. 37, VIII). Não há qualquer outro tipo de reserva com previsão constitucional. Então, seria necessário propor uma emenda à Constituição. Ainda assim, seria possível questionar se as cotas raciais, a pretexto de provocarem uma igualdade material, não provocariam desequilíbrios, ferindo frontalmente o princípio da isonomia e o da eficiência, basilares da administração pública e, em especial, dos concursos públicos. Enfatize-se que não é possível que uma lei ordinária estabeleça outra ressalva ao texto constitucional, ainda que com a justificativa de que visa ampliação de direitos, pois não são os concurseiros de qualquer outra cor que devem pagar a conta da dívida histórica com a população negra. Essa conta deve ser paga por toda a sociedade, por meio do Estado, com educação pública de qualidade.

O negro, ao concluir o nível médio ou o superior, cumpre requisito legal para ocupar cargo público, a depender, claro, do nível exigido. Ora, os negros hoje têm cota para ingressar nas faculdades. Supor que, ao concluir o ensino superior, eles ainda tenham direito a cota no serviço público, seria menosprezar a possibilidade de eles intelectualmente vencerem, ao longo do curso superior, as diferenças que porventura existam em relação aos outros. Quanto aos concursos que exigem nível médio apenas, a situação é um pouco diferente. É que o negro, na maioria das vezes, estudante de escola pública, embora receba do estado o certificado de conclusão do nível médio, na verdade, por ser o ensino tão ruim e a escola tão fraca, não consegue concorrer em pé de igualdade com outros que tenham estudado em escolas melhores. Então, com a criação da cota racial, o Estado está atestando sua incapacidade de oferecer um ensino médio de qualidade, pois, caso contrário, isso não seria necessário e, no que tange às políticas voltadas para o ensino superior, está assumindo que os resultados delas não são tão interessantes quanto propagandeiam seus defensores.

Ainda que fosse possível admitir a política de cotas raciais para concursos de nível médio, o critério da cor deveria ser objetivo, o que é impossível devido ao alto grau de miscigenação da população brasileira. Mesmo para aferir deficiências físicas, o que, em tese, seria mais objetivo, encontra-se grande dificuldade. Isso tem contribuído em muito para a constante judicialização dos concursos públicos. Se a inscrição no concurso se basear numa simples autodeclaração, permitindo, por exemplo, que um branco declare-se pardo, os terceiros que se julgarem prejudicados recorrerão ao Judiciário.

O projeto exclui pessoas de baixa renda que não sejam negras, que, por razões as mais diversas, também precisariam de ações afirmativas. O negro rico concorrerá às vagas reservadas. O branco pobre não. É evidente que há uma distorção na proposta. Melhor seria uma cota social.     

A cota de 5% para pessoas com deficiência, normalmente fixada nos editais, já é o suficiente para fazer com que a nota de corte (nota a partir da qual alguém consegue aprovação), para esse grupo de pessoas, seja muito inferior à nota de corte da lista geral. É possível verificar isso em qualquer concurso. O PLS 74/2010 (Lei Geral dos Concursos), recentemente aprovado no Senado e que agora tramita na Câmara, fixa 10% como limite mínimo e 20% como limite máximo. A Associação Nacional dos Concurseiros - Andacon posicionou-se contra os percentuais estabelecidos, pois a entidade entende que os 5% utilizados de praxe já são o bastante para o objetivo da política, que é integrar pessoas com deficiência ao mercado de trabalho. As cotas raciais, se concretizadas, terão a mesma característica. Com uma diferença, a reserva de 20% praticamente fará com que o concurso perca o caráter concorrencial. Ou seja, bastará ao negro tirar a nota mínima para conquistar o cargo. Isso não é direito. É privilégio. Se os 20% possíveis para as pessoas com deficiência forem somados com os 20% possíveis para os negros, então é possível ter 40% dos servidores entrando no serviço público, não por meio de um concurso, mas por meio de um teste de aptidão mínima, tal como é o Exame da Ordem dos Advogados.

Por essas razões, dentre muitas outras que poderiam ser arroladas, a Associação Nacional dos Concurseiros posiciona-se contra cotas raciais em concursos públicos. 

Guto Bello
Presidente da Associação Nacional dos Concurseiros

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